Volume III: A Sombra entre as Copas


 

Capítulo 8 – O Nome Que Anda Atrás

O planalto de Ennedi, no nordeste do Chade, erguia-se como uma ossada petrificada de um titã enterrado. Torres de arenito milenares furavam o céu como dentes, e entre elas, o calor reverberava com peso quase ritual.

Talia desceu do helicóptero com a pedra gravada nas mãos. Otávio a seguia, agora livre de contenção — mas não livre do fardo. Desde o contato com o Bangenza, ele vinha sentindo sonhos em outro idioma. Imagens de pedra. De fogo. E de um nome que não podia ser dito em voz alta.

Foram guiados por um Tuaregue silencioso, que não falou durante a jornada.

Apenas os levou até uma caverna conhecida pelos anciãos como “A Boca do Quarto Silêncio”.

Segundo os registros obtidos por Talia em manuscritos ocultos do Instituto de Cartografia Pré-Mítica, aquele local havia sido interditado séculos antes, quando “os Homens da Areia” ouviram o nome que “os três haviam escondido”.

No interior da caverna, não havia inscrições comuns.

Havia formas apagadas.

Símbolos raspados. Pinturas soterradas por fuligem. Como se alguém, há muito tempo, tentasse fazer o mundo esquecer o que ali estivera.

— Não estamos aqui para encontrar uma criatura — murmurou Otávio, ajoelhado. — Estamos aqui para encontrar o nome que todas as criaturas... temem.

Talia removeu parte do sedimento de uma das paredes centrais e revelou um entalhe oculto. Nele, três figuras bem conhecidas:

  • Uma espiral negra (Kalgh’ra).

  • Um círculo com apêndices (Amikuk).

  • Um primata com olhos ovais (Bangenza).

Mas abaixo delas, um espaço vazio. Não pintado. Não esculpido.

Gravado por ausência.

Uma silhueta sem contorno, mas cujas bordas estavam distorcidas, como se a rocha tivesse recuado.

E abaixo dela, em escrita proto-saariana:

Ak-Thur-El.

Otávio sentiu a cabeça latejar.

Talia, quase em transe, leu em voz alta.

— “Ak-Thur-El... Aquele que se move antes do som. Aquele que caminha por trás dos olhos. O que não existe. O que sustenta.”

Otávio cambaleou.

— Helena... ela mencionou esse nome em uma gravação perdida da base Borealis. Mas só uma vez. E depois... silenciou.

Talia leu o restante do painel, em voz quase trêmula.

“Não se mata Ak-Thur-El.
Não se adora Ak-Thur-El.
Não se fala de Ak-Thur-El.
Porque ao falar... ele anda.”

Naquele instante, a caverna tremeu.

Levemente.

Como se tivesse respirado.

Lá fora, o guia Tuaregue já havia desaparecido.

Otávio olhou para Talia, com os olhos marejando.

— Helena não sumiu. Ela foi... afastada. Escondida. Porque ela também leu o nome.

— E agora nós também.

No ar, uma pressão nova.

O vento no deserto passou a soar... como passos.

E no interior da caverna, uma sombra se moveu por entre o espaço onde nada havia sido esculpido.


Relatório Preliminar – Quimera (nível preto, criptografia mnemônica)
Título: Protocolo Sombra Ativa
Entrada de campo: Nome revelado em sítio proto-rúnico Ennedi.
Criptoforma hipotética: Ak-Thur-El
Classificação: Suporte estruturante da criptoforma simbólica. Não-entidade. Presença vestigial no tecido da realidade. Exposição sem contenção implica transgressão espacial.

Recomendação: Silenciamento absoluto dos envolvidos. Reclassificação de todas as manifestações anteriores como respostas parciais a Ak-Thur-El. Não permitir nomeação pública.

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