A Maldição de RootHollow
A família Grimstone está amaldiçoada.
Há muito tempo, quando os Milners e os Grimstones fundaram a cidade de RootHollow, uma rivalidade sangrenta germinou entre as duas famílias. A disputa culminou em um duelo mortal, onde ambos os patriarcas, Abel Grimstone e Lou Milner, juraram resolver suas diferenças em um embate final. Com uma arma em mãos, o pacto foi selado. Vinte passos separavam os dois homens. Apenas vinte.
Cinco passos.
Dez passos.
Quinze passos...
Um estampido ensurdecedor rasgou o ar, reverberando pela floresta densa. Nenhuma testemunha, apenas Abel e Lou. Abel não hesitou: a pistola fendeu o silêncio da madrugada, e Lou caiu, sua testa estourando sob o impacto da bala. Seu corpo se retorceu antes de tombar na terra, deixando um rastro de sangue escuro que se espalhava como uma mancha de morte.
Abel, sem nem um vislumbre de remorso, arrastou o cadáver de Lou pelos tornozelos, suas botas cravando-se no solo enlameado. Arrastando-o para uma cova rasa, Abel não se deu ao trabalho de enterrar o corpo com dignidade. Ele o deixou ali, empoleirado como um animal morto, e retornou para casa, com a mente já traçando a rota de vitória. Quando ele chegasse em RootHollow, o alarde seria inevitável. O chefe dos Milners estava morto, e com ele, a cidade se renderia aos Grimstones.
Mas naquela noite, ao cair na cama, Abel não pôde se livrar da sensação sufocante de que algo estava errado. Ele sentiu os olhos de Lou fixados em sua nuca, a presença espectral de seu inimigo morto, como se a própria sombra de Lou estivesse ali, esperando.
O calor da cama não era mais o suficiente para afastar o frio que o envolvia. Abel virou-se de lado, os olhos piscando contra a escuridão. Lou estava lá. Não podia ver, mas sentia a presença do fantasma, a figura alta que se estendia até o teto da pequena sala. Seus olhos mortos ainda se arregalavam, a expressão congelada de horror e raiva.
E Lou falava, mas Abel não ouvia. Não era necessário. Ele soubera o que Lou dizia com um calafrio profundo na espinha. "Você me matou..." era tudo o que os olhos de Lou transmitiam.
Com a respiração pesando em seus pulmões, Abel olhou para a esposa adormecida, buscando refúgio. O que ele tinha feito? Não podia ser real. Tudo isso seria um pesadelo. Mas a sensação persistia, aterradora e implacável.
Décadas depois, Drew, seu descendente, ouviu essa história e não acreditou. "Você está brincando, vovô," ele disse, rindo sem graça enquanto seu avô, Charlie, descansava cansado em sua cadeira.
"Você acha que estou brincando?" O tom de Charlie era grave, os olhos cansados refletindo os anos de angústia que haviam marcado a família.
Charlie contou sobre a tentativa de seu próprio pai de erradicar a maldição, viajando até o que restou de RootHollow. Não encontrou uma cidade, apenas ruínas e a atmosfera sufocante de um lugar maldito. Mas algo mais estava lá. Uma estátua macabra de Lou Milner, sua face retorcida, uma representação grotesca do ódio que ainda pairava sobre aquela terra.
"E alguém encontrou Lou?" Drew questionou.
Charlie assentiu, o semblante sombrio. "Shaw Milner, irmão de Lou, encontrou o corpo de seu irmão. Levou-o de volta e construiu aquela estátua... enterrando os restos sob ela. A maldição nunca nos deixou, Drew. E agora, está em suas mãos."
Drew, assustado com a revelação, não hesitou. Pegou um mapa e fez as malas, decidido a resolver o que seus ancestrais não conseguiram. Ele viajou até as ruínas de RootHollow, onde o frio o envolveu assim que colocou os pés naquele solo amaldiçoado. A estátua de Lou Milner ainda estava lá, como um monumento à morte, com uma expressão de dor congelada no rosto de bronze.
Drew começou a cavar. O som metálico da pá batendo contra algo sólido ecoou na calada da noite. Quando finalmente desenterrou o pacote, um cheiro pútrido e putrefato o atingiu. Dentro do tecido, os ossos de Lou estavam quebrados e corroídos, murchos e esverdeados pela decomposição, uma visão tão horrível que Drew mal pôde suportar.
Ele pegou os ossos e os jogou em uma fogueira, vendo as chamas consumir o que restava de Lou Milner. O calor e o cheiro de carne queimada o faziam estremecer. Drew acreditava que, ao destruir os restos mortais, a maldição seria finalmente quebrada.
Mas não foi.
Quando voltou para casa, ele foi recebido com um sorriso sombrio do avô e do pai. Aparentemente, tudo estava resolvido. Nenhum sinal de Lou. A maldição estava finalmente quebrada.
Até que Drew, antes de dormir, ouviu a batida na porta.
O instinto de não abrir foi abafado pela curiosidade. Quando olhou pelo olho mágico, não havia ninguém. Mas no tapete de boas-vindas, um cartão estava lá. O oito de espadas. Ele sentiu o peso da presença atrás de si, mas não ousou virar-se.
A voz sibilante veio de trás: "Você não pode escapar, Grimstone."
A mão com garras agarrou seu ombro com uma força sobrenatural, rasgando a carne como se fosse papel. Drew tentou gritar, mas sua garganta estava apertada pela dor.
"Não até que cada um de vocês esteja morto."
Os gritos de Drew se extinguiram na escuridão da casa. Fora, uma jovem espiava pela esquina, o sorriso em seus lábios satisfeito. Ela sabia que, mesmo com a destruição do fantasma de Lou, a maldição continuaria.
A família Grimstone sempre será amaldiçoada.
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