Volume I - O Abismo de Ness
Epílogo – O Vigia do Abismo
O tempo na Escócia passou.
Chuva.
Turistas.
Folclore reaproveitado como comércio.
O Instituto selou os relatórios.
A Agência Quimera silenciou os arquivos.
E Helena, isolada em uma base remota no norte da Noruega, revisava a cada noite as imagens da missão. O colar de vértebras pendia sobre seu pescoço. Um lembrete. Um aviso.
Foi numa madrugada que ela recebeu a mensagem.
Sem remetente.
Sem origem.
Apenas um vídeo.
O arquivo se abria com uma filmagem instável. Uma câmera presa ao ombro de um traje de mergulho. O nome no canto inferior: Harding-Δ_arquivo não classificado.
A imagem mostrava o fundo do lago — a mesma estrutura, os mesmos pilares antigos. Mas o santuário agora estava... vivo.
Respirava.
As paredes pulsavam. O limo se movia. E no centro da câmara, sentado sobre uma elevação de pedra negra, estava ele.
Harding.
Nu da cintura para cima, a pele marcada por símbolos em espiral. Seus olhos não eram mais os dele. Mas também não eram de Kalgh’ra.
Eram de alguém que lembrava.
Ele olhou diretamente para a câmera.
E falou.
— Vocês fecharam o selo. Mas não selaram a lembrança. Alguém deve lembrar. Alguém deve vigiar.
— Kalgh’ra não se move mais através do corpo. Ele move-se através do pensamento.
— Eu sou o último espelho. Quando esquecerem de mim... ele retornará.
A gravação terminou em silêncio.
Helena desligou o monitor.
No fundo, entendia: Harding não estava perdido.
Ele havia se tornado o vigia da fenda.
Aquele que impede Kalgh’ra de assumir novo hospedeiro.
Mas como toda vigília, ela tem um preço:
O esquecimento.
E em algum lugar, no fundo do mundo, entre pedras vivas e águas esquecidas, Alistair Harding ainda espera.
Não por resgate.
Mas por testemunhas.
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