O Uivo Carmesim
Na penumbra úmida das ruas desertas de uma grande metrópole africana, o som de passos ecoava pelo asfalto rachado. Tinham-se passado poucas horas do eclipse que mergulhara a cidade em trevas quase absolutas, quando um grupo de jovens, atraídos por relatos de desaparecimentos recentes, aventurou-se a explorar um beco esquecido, cujas paredes grafitadas com símbolos desconhecidos advertiam quanto ao perigo.
De súbito, um guincho agudo rasgou o silêncio: um grito prolongado e distorcido, semelhante a uma gargalhada histérica, que arrepiou a espinha até dos mais corajosos. Era o Booaa, o “Hiena Desconhecida da África Ocidental”, cujo nome derivava justamente daquele ulular aterrador. Diziam que o animal, de porte colossal, com pútridas mandíbulas repletas de presas serrilhadas e olhos incandescentes, surgia apenas sob a escuridão total, abrindo fendas na carne de sua vítima com voracidade faminta.
Os jovens, paralisados pelo terror, viram-no avançar por entre as lixeiras transbordantes. Seu pelo, enevoado de manchas roxas, parecia pulsar à luz rarefeita de um poste prestes a apagar-se. Num instante, uma das garotas soltou um grito estrangulado ao sentir, no seu ombro, o arranhão profundo de sua garra traseira, que expôs a carne viva e osso ósseo. O líquido escarlate jorrou com violência, marcando o beco como um altar de sangue.
A cada investida, Booaa dilacerava membros sem parcimônia: arrancava braços, decapitava com um ganido sinistro e arrastava cabeças para degustar o cérebro ainda trêmulo sob as mandíbulas. O chão ficou impregnado por uma poça viscosa de sangue misturado a uma gosma cinzenta — restos de vísceras esvairam-se por entre as lajotas, liberando um fedor acre que nauseou até os ratos que fugiam em pânico.
Um dos rapazes, tomado por desespero, tentou resguardar-se em uma porta de ferro, mas Booaa, com reflexos sobre-humanos, pulverizou-a num só golpe de pata anterior, transformando-a em fragmentos retorcidos. Em seu sorriso bestial, revelava fileiras de dentes curvos, cada um cravejado de fragmentos de osso e pele de vítimas anteriores. Sem hesitar, o criptídeo abriu a cabeça do rapaz como se fosse um coco, extraindo o cérebro ainda palpitante e lambendo-o com uma língua grudenta.
Enquanto a lua encoberta surgia, pálida e amarelada, Booaa ergueu-se sobre as patas traseiras para soltar seu brado infernal, reverberando pelas vielas e rompendo ainda mais os tímpanos de quem ousasse escutar. A cidade, atônita, parecia sussurrar um lamento: aquele monstro era possivelmente uma expansão ocidental do mítico Urso Nandi, mas ali nada restava de mitologia — somente a realidade crua e visceral do horror.
Na manhã seguinte, equipes de resgate encontraram o beco vazio. Restavam apenas manchas secas de sangue e fragmentos de ossos sem qualquer vestígio de pele ou músculo. O som, porém, permaneceu gravado na memória dos que sobreviveram: um eco interminável do uivo de Booaa, lembrando-lhes de que, no coração da escuridão urbana, o predador desconhecido continua à espreita, faminto por carne e medo.
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