Volume III: A Sombra entre as Copas
Capítulo 9 – Quando os Ecos Começam
Os registros não coincidiram à primeira vista.
Em Kinshasa, um operador da Quimera chamado Elias Bakongo acordou durante a madrugada e escreveu 127 linhas de um alfabeto que não conhecia, com os olhos fechados.
Em Edimburgo, uma paleolinguista aposentada foi encontrada murmurando palavras sem vogais, as mesmas entoadas por Marcus antes de se entregar à água no Lago Ness.
E no Alasca, nos arredores da antiga Base Borealis, um grupo de pescadores nativos relatou ouvir “o mar sussurrar debaixo do gelo”.
Tudo isso nas mesmas 12 horas.
A Quimera detectou as ocorrências.
Mas Otávio e Talia, ainda isolados no deserto do Ennedi, souberam antes.
Pois sentiam.
Não dor.
Não medo.
Mas presença.
—
O campo sísmico ao redor da caverna começou a emitir um padrão que os satélites descreveram como resíduo gravitacional anômalo. Não havia tremor. Mas as bússolas giravam. Os relógios atrasavam. Os rádios... recuavam segundos.
Como se o tempo estivesse hesitando.
Na sede da Quimera, o Conselho se reuniu de emergência.
Os três líderes da Seção Escarlate — Malik Dray, Dra. Enríquez e o cardeal-renunciante Mateus Arão — discutiam o que não queriam nomear.
Dray rebateu, severo:
— Precisamos isolar Talia Kojo e Otávio Gabriel imediatamente. Eles não podem sair do Saara. Nem em vida. Nem em palavra.
Mas foi interrompido.
Porque o vidro da sala de reuniões... se fragmentou.
Não estilhaçou. Se partiu em círculos concêntricos.
Como espelhos que se recusam a mentir.
Naquele momento, em outro continente, Otávio tremia em silêncio na caverna.
— Ele... ele não vem — disse. — Porque ele já está.
Talia chorava. Mas não de medo. De certeza.
Do lado de fora da caverna, as sombras se moviam de forma errática. Luzes de lanternas desligadas acendiam sozinhas. Os gravadores... tocavam vozes de pessoas mortas.
E no centro do deserto, um círculo de pedras começou a girar lentamente em sentido anti-horário.
Sem vento.
Sem força.
Apenas... eco.
—
Relatório excepcional | Núcleo de Contenção Temporal da Quimera
Conclusão: Não estamos sendo perseguidos. Estamos sendo repetidos.
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