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Volume IV: A Voz do Lago

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  Capítulo 4 – A Palavra que Quer Ser Vista Llyn Glaslyn – Três dias após a primeira manifestação flutuante 03h13 da madrugada Acordaram com o alarme. Os sensores visuais externos, apontados para a margem sul do lago, captaram movimento acima da superfície . Talia desceu com Hafiz e Dunne em silêncio absoluto. As imagens, ao vivo, mostravam o que não deveria ser possível: Um reflexo caminhando. Não o reflexo de alguém real. Mas autônomo . Ele caminhava devagar, descalço sobre a relva encharcada, como uma criança aprendendo a andar — mas com os traços de um adulto sem rosto, composto apenas de água trêmula em forma humana. A silhueta tinha braços, pernas e uma cabeça levemente inclinada. E no peito, pulsando como coração líquido: A palavra: Afânc. — Isso não é ele — sussurrou Talia. — Isso é o que ele está tentando construir . — Um corpo? — perguntou Hafiz. — Uma frase encarnada — corrigiu ela. O reflexo parou diante do grupo. Não falou com som. Mas projetou uma ...

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  Capítulo 3 – Os Nomes que Flutuam Llanberis, País de Gales Dois dias após a imersão A vila parecia intacta. Telhados de ardósia, ruas silenciosas, o aroma de pão assado no ar. Mas havia algo... calado demais. Talia e Hafiz foram recebidos pela médica local, Dra. Elsi Morgan, que os conduziu discretamente até a escola primária da vila. — Eles começaram a sonhar — disse Elsi. — Todos na mesma noite. E continuam... todas as noites. As crianças estavam sentadas em círculo, desenhando. Não figuras. Palavras. Símbolos. Linhas curvas que se fechavam em formas impossíveis, repetidas com precisão entre elas. Talia reconheceu de imediato: as mesmas marcas que haviam aparecido nas pedras submersas do lago . — Eles não sabem o que estão escrevendo — disse Elsi, sussurrando. — Mas os pais estão... ouvindo essas palavras em casa. Quando dormem. Quando encostam o ouvido na água das torneiras. Talia tocou um dos cadernos. A criança que o desenhava olhou para ela. E murmurou: — “A água lembra. ...

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  Capítulo 2 – A Profundidade que Fala Llyn Glaslyn, Snowdonia 06h11 – Missão de reconhecimento submerso O traje de Talia rangia sob a pressão. A água era turva, mas não escura — tingida por uma tonalidade leitosa, como se a própria luz ali se desfizesse em silêncio. Ao seu lado, o agente Hafiz operava os sensores hidrofonais. Dunne supervisionava a partir da superfície, mantendo o canal aberto. A 18 metros de profundidade, a vegetação cedia lugar a uma formação rochosa… impossível. Uma arcada. Três arcos de pedra suavemente curvados, com musgos que pareciam organizar-se em padrões de escrita — mas que só se tornavam legíveis quando não olhados diretamente . Talia aproximou-se, sentindo uma leve pressão atrás dos olhos. E então, um zumbido. Não do equipamento. Da água. — Estou ouvindo... não sons — murmurou. — Mas palavras… que não precisam de voz. Hafiz confirmou: — O sonar está captando reverberações rítmicas. Como leitura. Como se... a água estivesse nos escaneando. No centro d...

Volume IV: A Voz do Lago

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  Capítulo 1 – Onde a Água Sussurra Llyn Glaslyn, País de Gales 03h27 – Hora Local A névoa era espessa demais para ser natural. Flutuava sobre o lago como véu de algodão molhado, movendo-se contra o vento. Talia Kojo, agora comandante de campo da célula Liminares , observava a água a partir da margem de cascalho. Atrás dela, os agentes Dunne e Hafiz mantinham a cobertura — mas sabiam que ali, no escuro, nada que fizessem impediria o que quer que estivesse prestes a emergir. O silêncio do lago não era ausência de som. Era presença compacta . — Os pescadores disseram que ouviram uma voz — murmurou Hafiz. — Uma voz que os chamava... pelo nome. — Kalgh’ra também chamava — disse Talia, ativando o gravador mnemônico. — Mas o Afanc… ele puxa. Ela ergueu a mão. No centro da água, uma bolha surgiu. Seguiu-se uma ondulação, e então, uma forma indistinta. Não grande. Não monstruosa. Mas errada. Como um animal feito de partes conhecidas, mas com proporções incorretas. Algo entre castor e croc...

A Caçada do Caitetu-Mundé

     O entardecer no Mato Grosso chegava abafado e úmido, enquanto a mata fechada engolia os últimos raios dourados do sol. Um grupo de biólogos, liderado pela doutora Ana Cláudia Tavares, havia se instalado às margens do Rio Aripuanã, com o objetivo de catalogar possíveis espécies de mamíferos não descritos pela ciência. A expedição, financiada por um obscuro instituto europeu, tinha foco em relatos locais sobre um animal misterioso: o Caitetu-Mundé .      Segundo os ribeirinhos, era um tipo de porco-do-mato, mas com um comportamento mais agressivo, inteligente e... estranho. Não andava em grandes bandos como os queixadas, mas em pequenos núcleos familiares, e parecia observar os humanos com um olhar quase consciente. Suas trilhas eram encontradas frequentemente ao redor de armadilhas destruídas — como se o animal compreendesse o perigo.      O grupo estava há cinco dias na selva quando avistaram, ao entardecer, a primeira pegada: cascos d...

A Serpente do Abismo

     Nas selvas impenetráveis de Putao, no Myanmar, onde o calor é sufocante e a umidade impregna cada centímetro do ar, um monstro reptiliano, quase mítico, se esconde nas águas escuras e misteriosas dos rios. Conhecida como Bu-Rin , essa gigantesca serpente aquática, com seu corpo que se estende de 40 a 50 pés, é o pesadelo das aldeias locais e o terror dos aventureiros que ousam explorar essa região esquecida pelo mundo moderno. Suas escamas, uma mistura de verde musgo e negro profundo, se camuflam perfeitamente nas águas turvas, tornando-a invisível até o último momento, quando é tarde demais para escapar.      A primeira visão que os nativos tinham do Bu-Rin era através do som de ondas violentas quebrando no rio e o estalo da vegetação sendo arrastada pela força das águas. Em um dos relatos mais antigos, um pescador descreveu como a água parecia se "ferver" antes de uma explosão súbita de violência, quando a serpente saltou das profundezas, suas mandí...

O Monarca da Névoa

     Nas vastas montanhas de Snowdonia, onde o vento uivava como uma lamento ancestral, e as nuvens se entrelaçavam com o céu até desaparecerem nas profundezas de um horizonte eterno, o Brenin Llwyd emergia da bruma como uma entidade mítica e aterradora. Conhecido como o "Rei Cinza" ou o "Monarca da Névoa", esse gigante sinistro caminhava pelas trilhas esquecidas de Gwynedd e Powys, em território galês, buscando almas perdidas que ousavam aventurar-se em seu domínio.      A origem do nome Brenin Llwyd , que em galês significa "Rei Cinza", já deixava claro o quão imponente e temível essa criatura era. Ele era descrito como um gigante de proporções colossais, com pele pálida, quase translúcida, que refletia as nuvens densas que sempre o acompanhavam. Seu rosto, porém, era o verdadeiro terror. Em vez de características humanas ou animais, seu semblante parecia feito de pura neblina, uma máscara de vapor que mudava constantemente, fazendo-o parecer mais uma ...